Ação Executiva

A ação executiva (ou processo de execução) é o meio judicial que permite ao credor exigir o pagamento de uma dívida ou a entrega de um bem, quando o devedor não cumpre voluntariamente a obrigação reconhecida por lei. Em Portugal, esta ação decorre, em regra, nos tribunais cíveis, sendo regida pelo Código de Processo Civil, que estabelece procedimentos, prazos e garantias tanto para o credor como para o devedor. A seguir, exploramos os fundamentos, as etapas e as peculiaridades da ação executiva, destacando a sua relação com outros mecanismos como a insolvência e a execução fiscal.

Ação Executiva

1. Conceito e Fundamentação Legal

1.1. O que é a Ação Executiva?

A ação executiva é o instrumento processual que possibilita a um credor (exequente) forçar o devedor (executado) a cumprir uma obrigação — pagar uma quantia, entregar um objeto ou prestar um facto — já reconhecida num título executivo. Entre os exemplos de títulos que fundamentam a ação executiva, destacam-se:

  • Sentenças judiciais transitadas em julgado.
  • Decisões arbitrais ou injunções não contestadas.
  • Documentos particulares com força executiva (ex.: livranças e cheques).
  • Contratos autenticados em cartório ou com reconhecimento específico.

1.2. Base Legal no Código de Processo Civil

O Livro III do Código de Processo Civil regula o processo de execução, especificando:

  • Os tipos de execução (para pagamento de quantia certa, entrega de coisa ou prestação de facto).
  • As fases procedimentais (citação, penhora, venda de bens, pagamento aos credores).
  • As formas de defesa do executado e as modalidades de oposição à execução ou à penhora.

2. Princípios Fundamentais da Ação Executiva

2.1. Título Executivo

A execução baseia-se sempre num título que atesta a existência de um direito exigível. Sem esse título, não é possível iniciar a ação executiva. A ideia central é dar segurança jurídica: só se obriga à satisfação forçada de dívidas que tenham sido formalmente reconhecidas.

2.2. Par Conditio Creditorum

Embora a ação executiva seja impulsionada por um determinado credor, o sistema processual deve equilibrar os interesses de todos os reclamantes sobre o património do devedor. Se surgirem outros credores interessados, eles podem intervir e contestar a precedência do primeiro.

2.3. Cooperação dos Envolvidos

Tanto o exequente como o executado devem atuar com boa-fé. O credor não deve promover atos abusivos ou ilegítimos, enquanto o devedor tem a obrigação de não ocultar bens ou dificultar o processo.


3. Título Executivo: Exemplos e Requisitos

3.1. Sentenças Judiciais

Uma sentença cível que condene alguém a pagar uma quantia ou a entregar um bem é, por si só, um título executivo. Se o devedor não cumprir espontaneamente, a parte vencedora pode requerer a execução.

3.2. Injunção e Livranças

  • Injunção: Trata-se de um procedimento simplificado para cobrança de dívidas, sobretudo de natureza comercial ou civil, até determinado montante. Se o devedor não contestar, a injunção converte-se em título executivo.
  • Livrança/Cheque: Documentos de crédito que, se estiverem em conformidade legal (ex.: data, assinatura, quantias), podem ser apresentados diretamente no processo de execução para pagamento de quantia certa.

3.3. Contrato Particular com Reconhecimento

Alguns contratos (ex.: empréstimo bancário) podem conter cláusulas que conferem força executiva. Em certos casos, a lei exige autenticação por notário ou outra formalidade para garantir a validade executiva.


4. Quem Pode Ingressar com Ação Executiva?

4.1. O Credor (Exequente)

É quem detém o título executivo. O exequente apresenta a petição inicial, indicando os factos e o valor em dívida, bem como os bens do devedor suscetíveis de penhora (caso os conheça).

4.2. Legitimidade Extraordinária

  • Sub-rogação: Se alguém pagou a dívida de outrem, pode “sub-rogar-se” nos direitos do credor originário e cobrar do devedor principal.
  • Herdeiros: Num crédito deixado por alguém falecido, os sucessores podem dar continuidade ou iniciar a execução.

5. Estrutura do Processo de Execução

5.1. Petição Executiva

O credor redige a petição, juntando o título executivo e descrevendo a obrigação devida. A petição é entregue ao tribunal (ou em plataforma eletrónica), que, após análise preliminar, determina a citação do devedor.

5.2. Citação do Devedor (Executado)

O tribunal notifica o executado para pagar a dívida ou, se preferir, apresentar bens à penhora e, eventualmente, opor-se à execução. Geralmente, concede-se um prazo (ex.: 20 dias) para essa reação.

5.3. Penhora

Se o devedor não pagar no prazo ou não se chegar a um acordo, segue-se a penhora de bens. Um agente de execução (solicitador de execução ou oficial de justiça) realiza buscas nos registos e bancos, identificando património penhorável. A penhora efetiva-se quando:

  1. Se retêm valores em contas bancárias ou se apreendem fisicamente bens móveis.
  2. Se regista a penhora de imóveis na conservatória do registo predial.
  3. Se notifica a entidade patronal (no caso de Penhora de Vencimento).

5.4. Avaliação e Venda de Bens

Os bens penhorados podem ser avaliados por peritos ou com base em tabelas padrão. Em seguida, procede-se à venda, que pode ocorrer via leilão eletrónico, proposta em carta fechada ou negociação particular, conforme a lei e a autorização do juiz.

5.5. Pagamento ao Credor

Concluída a venda, o dinheiro obtido é aplicado no pagamento das custas e despesas do processo, dos honorários do agente de execução e, finalmente, da dívida ao credor. Se restar saldo, pode ser devolvido ao devedor ou direcionado a outros credores com Penhoras subsequentes.


6. Modalidades de Execução

6.1. Execução para Pagamento de Quantia Certa

É a mais comum, usada quando o título indica claramente que o devedor deve pagar uma quantia (dinheiro). A penhora incide prioritariamente sobre saldos bancários, rendimentos e bens de fácil alienação.

6.2. Execução para Entrega de Coisa

Se o título obriga o devedor a entregar um bem móvel ou imóvel, o agente de execução tenta apreendê-lo e entregá-lo ao credor. Se não for possível encontrar o objeto, podem converter-se os direitos do credor em indemnização monetária.

6.3. Execução para Prestação de Facto

Neste caso, o título estabelece que o devedor deve realizar ou abster-se de certo ato (por exemplo, demolir uma construção irregular). Se ele se recusar, pode-se contratar terceiros para executar a prestação, com custos a cargo do devedor.


7. Oposição à Execução e Defesa do Devedor

7.1. Oposição à Execução

O devedor pode contestar a execução no prazo legal (normalmente 20 dias após a citação), alegando, por exemplo:

  • Extinção da dívida por pagamento ou prescrição.
  • Inexistência ou nulidade do título executivo.
  • Falta de cumprimento de formalidades.

Se a oposição for julgada procedente, a execução extingue-se ou é anulada na parte relevante.

7.2. Oposição à Penhora

Mesmo que o devedor não se oponha à própria execução, pode contestar especificamente a penhora, sustentando que:

  • Os bens não pertencem ao executado.
  • São Bens Impenhoráveis ou estão acima do limite legal de penhora.
  • A penhora excede o valor da dívida e configura abuso.

Nesses casos, o tribunal analisa os argumentos e, se pertinentes, pode levantar a penhora ou reduzi-la.


8. Incidentes e Intervenção de Outros Credores

8.1. Embargos de Terceiro

Se um terceiro, não sendo parte no processo, se vir afetado pela penhora (por exemplo, se o bem penhorado lhe pertence), pode propor embargos de terceiro para fazer valer o seu direito de propriedade. O tribunal irá então averiguar a real titularidade do bem.

8.2. Concurso de Credores

Vários credores podem concorrer no mesmo processo executivo se reivindicarem o mesmo bem ou se o valor obtido na venda abranger vários reclamantes. Nessa hipótese, forma-se um concurso de credores, que respeita a ordem de privilégios e garantias para partilhar o produto da penhora.

8.3. Ação Executiva e Insolvência

Se, durante a execução, surgir um processo de insolvência relativo ao devedor, a ação executiva fica normalmente suspensa, integrando-se os créditos reclamados no Processo de Insolvência. As Penhoras individuais realizadas antes da declaração de insolvência podem ser anuladas se violarem a par conditio creditorum.


9. Custas, Honorários e Despesas

9.1. Custas Judiciais

O processo executivo acarreta custas, calculadas conforme o valor da execução. O credor antecipa parte dessas custas, mas, em caso de sucesso, pode recuperá-las do devedor (incluindo juros de mora e outras despesas).

9.2. Honorários do Agente de Execução

O agente de execução recebe honorários fixados em tabela legal, que podem incluir uma componente fixa mais uma percentagem sobre o valor efetivamente cobrado. Se o processo terminar sem recuperação de ativos, pode haver complicações quanto ao pagamento destes honorários.

9.3. Despesas Adicionais

Podem surgir gastos com avaliações, leilões, notificações, publicações em plataformas oficiais, transporte de bens, etc. O tribunal, ao final, determina de que forma esses custos serão imputados, em regra ao devedor quando há vencimento do credor.


10. Formas de Extinção da Execução

10.1. Pagamento Voluntário

O executado pode pagar integralmente o montante exigido (dívida principal, juros, custas) antes ou após a penhora, mas sempre antes da venda dos bens. Nesse caso, a execução extingue-se, levantando-se eventuais Penhoras.

10.2. Falta de Bens Penhoráveis

Caso não sejam encontrados bens ou rendimentos suficientes, e o devedor não apresente meios de pagamento, o processo pode ser extinto por insuficiência patrimonial. O credor pode, porém, reabrir a execução se, no futuro, descobrir a existência de novos bens.

10.3. Acordo ou Transação

Credor e devedor podem chegar a um acordo extrajudicial (por exemplo, plano de pagamentos faseado). Se homologado ou reconhecido no processo, a execução suspende-se enquanto o devedor cumpre o pactuado, extinguindo-se depois.

10.4. Declaração de Insolvência

Se, por qualquer motivo, for decretada a insolvência do executado, a ação executiva cessa, passando o credor a habilitar-se no Processo de Insolvência. Lá, receberá a sua parte conforme a ordem de credores e os ativos disponíveis na Massa Insolvente.


11. Execução Fiscal: Semelhanças e Diferenças

11.1. O que é Execução Fiscal?

A execução fiscal é o processo que a Autoridade Tributária utiliza para cobrar dívidas de impostos e taxas de forma coerciva. Semelhante à ação executiva, mas dispensando o rito tradicional, a AT pode penhorar bens do devedor com base em certidões de dívida.

11.2. Especificidades

  • Não passa pelo juiz cível em cada ato: a administração fiscal tem poderes próprios para solicitar informações bancárias e penhorar contas.
  • O devedor ainda pode opor-se, mas a tramitação corre pelos tribunais administrativos e fiscais.
  • Mantêm-se, porém, os princípios de proteção mínima (impenhorabilidade de determinados bens, limites de Penhora de Vencimento).

12. Perguntas Frequentes

1. Como saber se tenho uma ação executiva contra mim?
Pode verificar no Portal Citius (consulta pública) ou receberá a citação oficial. Em processos fiscais, consulte o Portal das Finanças. Se foi citado por um agente de execução e ignorou as notificações, a penhora pode avançar sem o seu conhecimento pessoal.

2. Posso negociar com o credor antes de serem vendidos os meus bens?
Sim. Em qualquer fase do processo, é possível propor um acordo ou pagamento voluntário para evitar a venda judicial. Basta informar o tribunal ou o agente de execução. Se o credor aceitar, suspende-se a execução até ao cumprimento total ou parcial.

3. E se a venda dos bens render mais do que o valor da dívida?
O excedente, após pagamento da dívida, juros, custas e honorários do agente de execução, deve ser devolvido ao devedor ou entregue a outros credores que tenham Penhoras registadas. Se não houver mais credores, o devedor recebe a quantia remanescente.

4. A ação executiva pode ser cancelada se o título for inválido?
Sim. Caso o tribunal conclua que o título não tem força executiva ou que a dívida foi extinta, a execução é extinta e o devedor recupera quaisquer bens penhorados. O credor pode ainda ter de compensar o devedor por danos sofridos indevidamente.

5. Qual a diferença entre ação executiva e injunção?
A injunção é um procedimento pré-executivo para obtenção de título executivo em dívidas não pagas de valor limitado (ou sem limite, dependendo das regras vigentes). Se o devedor não contestar, a injunção converte-se em título executivo e pode dar início à ação executiva caso o devedor persista no incumprimento.

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