Contraído Dívidas

Em Portugal, muitas pessoas contraem dívidas ao longo da vida, seja para financiar a compra de um imóvel ou veículo, seja para enfrentar despesas pontuais ou emergências de saúde. Embora o recurso ao crédito seja uma ferramenta útil em determinadas situações, a acumulação excessiva de dívidas pode levar ao sobre-endividamento e desencadear problemas financeiros graves.

Este texto explora as razões pelas quais as pessoas contraem dívidas, como identificar sinais de alerta, que tipos de débitos costumam surgir e como lidar com eles de forma responsável. Também aborda as consequências de não pagar obrigações a tempo, as possíveis soluções — desde a renegociação até a insolvência — e boas práticas para evitar cair em sobre-endividamento crónico.

Contraído Dívidas

1. Introdução: Por Que Contrair Dívidas Pode Ser Útil ou Perigoso

1.1. Conceito de Dívida e Crédito

Quando uma pessoa “contrai dívidas”, significa que contrata empréstimos ou adquire bens/serviços sem pagar de imediato, comprometendo-se a saldar o valor futuramente, muitas vezes acrescido de juros. O crédito, portanto, consiste na antecipação de recursos que permitem concretizar objetivos (como comprar casa, carro, etc.) ou cobrir despesas urgentes. Pode ser obtido em instituições bancárias, empresas de crédito, lojas (para compras a prestações) ou mesmo junto de familiares e amigos.

1.2. Vantagens e Riscos

  • Vantagens: Facilita grandes aquisições (habitação, automóvel), possibilita equilibrar o orçamento em meses difíceis, apoia investimentos que geram retorno.
  • Riscos: Excesso de dívidas pode gerar dificuldades no pagamento de prestações, e as taxas de juro elevadas podem agravar o montante devido. A falta de controlo e planeamento orçamental frequentemente leva ao endividamento descontrolado.

1.3. Situação em Portugal

Portugal, historicamente, apresenta uma elevada propensão ao uso de crédito ao consumo e habitação. A crise financeira de 2008 e, mais tarde, a crise pandémica, colocaram em evidência a fragilidade de muitos agregados familiares sobre-endividados. Este contexto reforçou a importância de educar financeiramente as pessoas para contrair dívidas de forma responsável, evitando a acumulação de encargos impagáveis.


2. Principais Razões para Contrair Dívidas

2.1. Aquisição de Habitação

Uma das causas mais comuns em Portugal é o empréstimo à habitação (crédito hipotecário). As famílias adquirem casa própria, pagando em prestações ao banco por 20, 30 ou até mais anos. Embora seja um investimento estável, se o orçamento familiar não for equilibrado, a prestação pode pesar fortemente.

2.2. Consumo e Cartões de Crédito

O crédito ao consumo, frequentemente associado a cartões de crédito ou a financiamentos rápidos para pequenas compras (eletrodomésticos, eletrónica, férias), é atrativo mas pode tornar-se perigoso devido a juros altos e multiplicidade de prestações, que consomem grande parte do rendimento mensal.

2.3. Despesas Médicas e Emergências

Quando surgem problemas de saúde, ou outras emergências (desemprego súbito, avaria do carro, reparações urgentes na casa), é comum recorrer a empréstimos para cobrir custos inesperados. Esta decisão, se não planeada, pode tornar-se um fardo no orçamento familiar, principalmente se não houver um fundo de emergência prévio.

2.4. Investimentos Empresariais ou Profissionais

Empreendedores e profissionais independentes podem contrair dívidas para lançar ou expandir negócios, adquirir equipamento, alugar espaços comerciais, etc. Se a atividade gerar rendimento suficiente para cobrir o crédito, é uma estratégia viável. Mas se o retorno demorar ou for menor que o previsto, surge o risco de incumprimento.

2.5. Pressões Sociais e Desejo de Consumo

A vontade de ter um padrão de vida mais elevado, pressionado pela publicidade ou pelo grupo social, leva muitas pessoas a financiarem luxos ou bens de marca que não poderiam adquirir a pronto pagamento. Esse comportamento gera dívidas que podem ultrapassar a capacidade real de pagamento.


3. Tipos de Dívidas Mais Frequentes

3.1. Crédito Habitação

Comum na aquisição de casa própria, é geralmente o crédito de maior valor e prazo. As prestações mensais podem ser indexadas à Euribor (taxa variável), implicando variações periódicas nas mensalidades.

3.2. Crédito Automóvel

Permite comprar carro novo ou usado, mas traz juros que podem ser superiores aos de um crédito pessoal. Alguns contratos funcionam com reserva de propriedade, em que o veículo pode ser retomado pela entidade financiadora se houver incumprimento.

3.3. Cartões de Crédito e Linhas Rotativas

A flexibilidade dos cartões de crédito é atrativa, contudo, as taxas de juro podem exceder 15% ou 20% ao ano. O pagamento mínimo mensal cobre sobretudo juros, prolongando a dívida e encarecendo-a muito.

3.4. Crédito Pessoal

Inclui empréstimos para finalidades diversas (saúde, educação, férias, etc.). Costuma ter juros mais altos que um crédito habitação, mas permite obter capital rapidamente sem justificação de uso.

3.5. Dívidas Fiscais ou à Segurança Social

Empresas e particulares podem acumular dívidas ao Fisco ou à Segurança Social, sujeitas a processo de execução fiscal. A Autoridade Tributária goza de poderes especiais para penhorar salários e bens sem passar pelo rito judicial comum.

3.6. Empréstimos Informais

Muitas famílias recorrem a familiares ou amigos para obter dinheiro a juros baixos ou nulos. Embora pareça solução mais simples, pode gerar conflitos pessoais caso não se consiga reembolsar no prazo. Também não há regulação formal, o que dificulta litígios.


4. Sinais de Problemas de Endividamento

4.1. Uso Contínuo de Cartões de Crédito para Despesas Correntes

Se, mês após mês, precisa de recorrer a crédito rotativo para pagar alimentação, rendas ou outras contas essenciais, pode ser sintoma de que o rendimento não cobre as despesas fixas.

4.2. Falta de Poupança e Fundos de Emergência

Não ter uma reserva financeira para imprevistos agrava a necessidade de contrair dívidas sempre que surge um problema urgente, perpetuando um ciclo de endividamento.

4.3. Atraso ou Incumprimento em Várias Prestações

Quando se falham regularmente prestações (ou se faz “rolagem” de dívidas entre diferentes créditos), é provável que o endividamento se esteja a tornar insustentável.

4.4. Conflitos Familiares

Discussões recorrentes sobre falta de dinheiro, dificuldade em pagar as contas, ansiedade ou depressão associada a dívidas podem indicar que o orçamento familiar está desequilibrado.


5. Consequências de Não Pagar Dívidas

5.1. Juros de Mora e Encargos

Cada dia de atraso pode gerar juros adicionais, multas e encargos administrativos. O valor final a pagar cresce exponencialmente, dificultando ainda mais a regularização.

5.2. Ações de Execução e Penhoras

Se se mantiver o incumprimento, o credor pode avançar para uma Ação Executiva, penhorando bens (carros, imóveis, contas bancárias) ou partes do salário. Em dívidas hipotecárias, a casa pode ser executada e vendida em leilão.

5.3. Reputação e Acesso a Crédito Futuro

Ficar com histórico de não pagamento impede ou dificulta obtenção de novos créditos. Instituições financeiras consultam bases de dados (centrale de riscos) e, se consta incumprimento, recusam pedidos ou aplicam juros mais elevados.

5.4. Risco de Insolvência

Dívidas demasiadas e impossíveis de satisfazer podem levar ao processo de insolvência, em que o devedor vê o seu património liquidado. No caso de pessoas singulares, pode tentar a exoneração do passivo restante ao fim de certo PERíodo, mas esse caminho é árduo e restritivo.


6. Como Lidar com as Dívidas Contraídas

6.1. Diagnóstico Financeiro

O primeiro passo é identificar todas as dívidas, respetivas taxas de juro, montante em aberto e prazos. Em paralelo, listar receitas e despesas mensais, percebendo onde é possível cortar custos ou aumentar rendimentos.

6.2. Priorizar Pagamentos

Algumas dívidas têm juros mais altos (cartões de crédito, por exemplo). Se possível, convém liquidar primeiro as mais onerosas. Também é crítico evitar incumprimentos em créditos hipotecários, sob pena de perder a habitação.

6.3. Negociar com Credores

Bancos e financeiras preferem, em muitos casos, renegociar prazos e taxas de juro a instaurar processos judiciais. Apresentar um Plano de Pagamentos realista pode levar à redução de prestações ou congelamento de juros moratórios.

6.4. Consolidar Créditos

Unificar várias dívidas num único empréstimo, com prazo mais dilatado, reduz a prestação mensal, embora prolongue o pagamento no tempo. É essencial comparar propostas e garantir que a taxa de juro seja efetivamente mais vantajosa.

6.5. Aconselhamento Profissional

Entidades como a Deco Proteste (no âmbito do Gabinete de Apoio ao Sobre-endividado) ou advogados especializados podem orientar na elaboração de planos de recuperação financeira, esclarecendo opções como o Processo Especial para Acordo de Pagamento (PEAP) ou a insolvência.


7. Evitar Contrair Dívidas Desnecessárias: Boas Práticas

7.1. Orçamento Mensal

Fazer um orçamento, registando receitas e despesas, é fundamental para saber quanto se pode destinar ao lazer ou à poupança. Assim, diminui-se a tentação de recorrer ao crédito para gastos supérfluos.

7.2. Fundo de Emergência

Guardar uma quantia mensal (mesmo que pequena) para criar um fundo que cubra 3 a 6 meses de despesas básicas. Isso reduz a probabilidade de contrair dívidas quando surgem imprevistos.

7.3. Comparar Taxas de Juro

Antes de assinar um empréstimo, comparar ofertas de várias instituições. Verificar a TAEG (Taxa Anual de Encargos Efetiva Global) para entender o custo real do crédito. Ler cláusulas de penalização por atraso.

7.4. Atenção a Pagamentos Mínimos em Cartões

Pagar apenas o mínimo exigido em cartões de crédito prolonga indefinidamente a dívida e encarece-a imenso devido aos juros. Sempre que possível, liquidar o total ou a maior parte da fatura mensalmente.

7.5. Consumo Consciente

Avaliar se a compra é realmente prioritária. Planeie grandes aquisições (como eletrónica, férias) com antecedência, poupando ou negociando melhores condições para evitar parcelas infinitas.


8. Quando a Situação Fica Incontrolável: Caminhos Legais

8.1. Plano de Acordo Extrajudicial

Antes de recorrer à Justiça, pode tentar-se um acordo global com todos os credores (por exemplo, através de mediação ou do PEAP). Muitas vezes, as entidades preferem receber de forma faseada a arrastar um processo longo.

8.2. Processo Especial de Revitalização (PER)

Dirigido a empresas e empresários em nome individual, o PER pode ser uma via para reestruturar dívidas sem cair em insolvência. No caso de consumidores comuns, pode não ser a melhor solução, mas existem processos semelhantes (PEAP) que servem para cidadãos.

8.3. Insolvência Pessoal

Se não houver solução, a insolvência pessoal é o último recurso. O devedor perde autonomia sobre o património, mas pode conseguir a Exoneração do Passivo Restante após um PERíodo de cessão de rendimentos (3 a 5 anos), ficando livre das dívidas que não tenha conseguido pagar. É um processo exigente e com consequências a longo prazo, mas para quem não vê saída, pode representar um “recomeço” financeiro.


9. Importância da Educação Financeira

9.1. Base para Evitar Dívidas Desnecessárias

Escolas, empresas e entidades públicas devem promover conhecimentos sobre juros, prazos, planeamento orçamental e gestão de riscos. Quanto melhor a literacia financeira, menos erros e decisões precipitadas ao contrair dívidas.

9.2. Ferramentas Digitais

Aplicações de controlo de despesas, simuladores de crédito e portais de comparação de taxas ajudam os consumidores a compreender o impacto de cada empréstimo, evitando surpresas desagradáveis.

9.3. Sustentabilidade Financeira ao Longo da Vida

Planear reforma, seguros e possíveis despesas futuras (educação dos filhos, cuidados de saúde) reduz a necessidade de contrair dívidas numa fase mais vulnerável (por exemplo, desemprego ou doença).


10. Perguntas Frequentes (FAQ)

1. Devo usar um cartão de crédito para pagar outro?
Não é recomendável, pois isso apenas transfere a dívida de um lugar para outro, muitas vezes com juros ainda maiores. Se se tornar prática recorrente, indica sobre-endividamento.

2. Como saber se estou a contrair demasiadas dívidas?
Alguns indicadores incluem: as prestações ultrapassarem 30% ou 40% do seu rendimento líquido, atrasar regularmente faturas, recorrer a créditos para despesas banais, ou sentir ansiedade constante com os prazos de pagamento.

3. Posso renegociar um empréstimo habitação se as taxas subirem muito?
Sim. Muitas instituições aceitam renegociar prazos, spreads ou até conceder PERíodos de carência temporária. Vale a pena contactar o banco antes de entrar em incumprimento.

4. Contrair dívidas para investir em criptomoedas ou ações é aconselhável?
Trata-se de um risco elevado. Geralmente, não se recomenda investir com dinheiro que não se tem ou que se precisa para outras despesas. Se o investimento falhar, a dívida continua a existir, sem qualquer garantia de retorno.

5. A insolvência é uma forma de me livrar de dívidas sem pagar nada?
Não exatamente. A insolvência implica a venda de todos os bens penhoráveis e a entrega de parte do seu salário (acima do mínimo existencial) por 3 a 5 anos. Somente após esse PERíodo, se cumprir os deveres de boa-fé, pode obter Exoneração do Passivo Restante. É um processo que deve ser encarado como último recurso.

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